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janeiro 26, 2007

A vantagem competitiva das cidades 

Estamos em Janeiro de 2007.
Das conversas que tenho regularmente com outros cidadãos da região onde vivo, tenho sentido uma geral e estranhamente consensual impressão que a cidade do Porte está a perder as suas características únicas e diferenciadoras que a tornaram num passado (já não tão recente) numa referência nacional, ibérica e europeia.

Actualmente, visitar o Porto, na sua baixa e ter que ir lá, é para mim uma enorme dor, no sentido em que as recordações de estudante (tanto no ensino secundário, como universitário) não se podem rever na actual cidade. Um exemplo extremo é a Praça de Lisboa, onde me lembro de hà cerca de uma década ir regularmente comer, quando da frequência do meu mestrado na Rua dos Bragas - simplesmente evito agora ir ao Porto, até para não me confrontar com uma cidade que já não existe.

Sair da armadilha em que se encontra é necessário para o Porto. Dessa forma, tem de garantir a não desertificação de pessoas, do conhecimento e da economia. Ora é precisamente o contrário que o Porto está a fazer, fechando-se nos que ficam e que estão reféns da ajuda e do apoio social. Estes, correm o risco de estar cada vez mais entregues aos próprios e a uma cidade que deixará progressivamente de os poder suportar.

Abrir o Porto ao conhecimento, à internacionalização e aos seus pares que tem sucesso fora dos seus limites geográficos é (era...) uma das características do Porto (pelo menos uma lembrança recente nos anos 80). Aumentar a sua área de influência e assumir o Porto como Porto/Gaia no mínimo e a região AMP como seu objectivo estratégico é ver o futuro. Pergunto-me quem tomará esta visão e assumirá politicamente este caminho? estou certo que os medos e as resistências populares são cada vez menores, na medida em que o precipício económico e social se aproxima a passos largos.

Para se jogar este jogo são necessárias pessoas com conhecimento, qualificações e competências; estas só são atraídas com mudança e criação de dinâmicas que não passam por remodelar o que existe, mas por reinventar novas formas de as relacionar, facilitar a vida e potenciar o que possam produzir - o tal conhecimento.

Ainda recentemente, uma aluna de doutoramento que está a desenvolver o tema da marca territorial, partilhava comigo (obrigado Sofia), o seguinte texto, transcrito com alguns cortes - para ler com atenção! - da EXECUTIVE DIGEST:

Rosabeth Moss Kanter fala da vantagem competitiva das cidades

Há uma grande guerra em curso entre dois géneros de cidades. De um lado, há as que se tornaram cosmopolitas, que conseguiram casar o "local" com o "global". Do outro, as que ainda não conseguiram sair da sua paróquia, as que se tingiram de cinzentismo provinciano e que, por isso, definham. As primeiras promoveram novas estratégias, através das quais estão a posicionar-se para competir no próximo século; as segundas deixam morrer as indústrias e serviços, perdem os quadros, ou seja, desertificam-se.

Rosabeth Moss Kanter, da Harvard Bussiness School, foi à procura dos factores da vantagem competitiva das cidades e descobriu três, conforme explicado no seu livro "World Class - Thriving Locally in the Global Economy".

Tomando o exemplo de Boston que se transformou numa fábrica de ideias, em grande parte devido à acção das suas universidades: Massachusetts Institute of Technology (MIT) e a Harvard Bussiness School. O MIT foi o berço da reengenharia, do professor Hammer e pelo consultor Champy, e do conceito das organizações que aprendem, do professor Peter Senge. O Media Lab do MIT, liderado por Nicholas NegroPonte, apresenta um constante suceder de propostas inovadores, com grande prestígio internacional. Harvard, pelo seu lado, todos os semestres debita novidades de "management", através de nomes sonantes com Porter, Argyris, Kao, Bartlett, Wheelwright entre outros. Os seus alunos são requisitados pelas maiores consultoras estratégicas como a McKinsey, Boston Consulting Group, Monitor Company, CSC Index e Booz Allen & Hamilton.

Como é que começou a interessar-se pelo problema da renovação urbana e da competitividade das cidades?

ROSABETH MOSS KANTER - Pela constatação de um paradoxo. Quanto mais eu observo as tendências globais que afectam positivamente cidades e regiões, que tenho visitado em países em desenvolvimento, mais estou preocupada em compreender os impactos dessas mudanças nas cidades e regiões dos países com um desenvolvimento mais maduro. O mundo dos negócios está cada vez mais interessado em desenvolver as suas cadeias de valor, as suas redes, fora das suas regiões de origem, e o próprio comércio internacional tem aberto novas oportunidades. Isso é óptimo para as empresas pois abre-lhes as portas dos mercados globais e liberta-as de estarem prisioneiras dos mercados locais...

..a reorganização industrial (com a deslocalização) e dos serviços (incluindo os bancos), bem como a emergência de novas indústrias (como as telecomunicações), estão a significar para as cidades a perda das sedes das corporações. Paralelamente, os líderes empresariais com consciência cívica estão a ser substituídos por gestores sempre em trânsito, que acumulam milhas de voo. Atenta a esta realidade comecei a ficar muito interessada em perceber o que se passava na minha própria região natal, Boston, e constatei que com a globalização passou a haver um crescendo de interesse pelo desenvolvimento regional. Começou a gerar-se um conjunto de questões de fundo para reflexão. Sobre qual é a unidade de governação adequada neste novo mundo global, se a Nação ou a macrorregião (como na vossa Europa). E, ao mesmo tempo, há também um renascimento do papel das cidades e das suas áreas metropolitanas, que são regiões mais pequenas. As cidades estão a assumir maior responsabilidade neste novo contexto. Na própria Europa, o grupo das eurocidades é um assunto interessante a seguir.

Que relação encontra entre os seus conceitos sobre a emergência das cidades e das áreas metropolitanas e a teoria de Kenichi Ohmae sobre a emergência das regiões?

R.M.K - Kenichi fala de regiões ainda maiores, que ultrapassam as fronteiras dos países actuais. Essas tendências transfronteiriças estão, de facto, a acontecer. Algumas sub-regiões dentro de alguns Estados-Nação estão a afirmar-se. Por exemplo, nos Estados Unidos há regiões fronteiriças com fortes relações com o Canadá que seguem essa lógica, e também na fronteira entre a França e a Alemanha. Julgo que continuarão a existir Estados-Nação, mas que, em simultâneo, estão a emergir muitos outros mecanismos de governação. É o caso, por exemplo, de algumas associações económicas, algumas muito maiores que Estados-Nação. Assistimos, assim, ao nascimento de mais níveis de coordenação, e de integração e de mais redes de cooperação, em que alguns desses níveis assumirão papéis que antes eram desempenhados pelos Estados-Nação. Isto significa que precisamos de uma grande flexibilidade. Nalgumas áreas assistimos a uma maior coordenação internacional, noutros casos surgirão blocos comerciais regionais, e noutros ainda aparecerão unidades económicas mais pequenas. Por exemplo, vemos isso nos Estados Unidos. Há aqui muitas sub-regiões económicas a moverem-se, tal como as cidades e os Estados da Federação estão a mover-se também. O mesmo acontece nalgumas cidades europeias. Ora, todas as cidades no mundo estarão interessadas em relações directas entre si, para trocas comerciais e de informação, e provavelmente até o farão sem o envolvimento dos seus Estados-Nação respectivos.

Mas, apesar de toda essa emergência urbana, para além das poucas megacidades "globais" existentes no mundo (como Nova Iorque, Londres, Tóquio...), existirá de facto um lugar nesta era da globalização para outras cidades?

R.M.K.- Obviamente. Três delas são actualmente capitais financeiras globais: Nova Iorque, Londres e Tóquio. Nessas cidades há muitas outras especializações em serviços profissionais, mas elas são basicamente capitais financeiros. Na Europa, creio que Frankfurt está também a tentar posicionar-se nesse jogo. Mas, poderão existir mais cidades globais especializadas noutras áreas, para além da financeira. Nos Estados Unidos, há outros casos. A minha cidade, Boston, ou a região de Silicon Valley, ou da baía da São Francisco, são capitais do ensino superior e de inovação tecnológica. No fundo, penso que na economia global há lugar para os mais diversos tipos de cidades se tornarem centros globais. O problema é este: como é que se adquirem competências específicas para o desempenharem.

Como é que isso é possível? Pode dar-nos alguns exemplos?

R.M.K. - Deixe-me falar-lhe de casos recentes, nos Estados Unidos, de cidades que conseguiram "dar a volta". Por exemplo, Atlanta, com base nos Jogos Olímpicos de 1996, transformou-se num centro internacional. E como cidade captou muitas sedes de multinacionais da área produtiva ou de serviços, tornou-se num centro de inovação e uma verdadeira placa giratória. Um outro exemplo: na própria área financeira há outras cidades, para além das três grandes globais, que descobriram o seu lugar à escala global como é o caso de Boston nos fundos de investimento.

Na economia global de informação em que vivemos, o poder não provém da localização em si, mas da capacidade de operar um desses três "activos" intangíveis: os conceitos, a competência e as conexões. Conceitos são ideias avançadas, desenhos ou novas formulações para produtos ou serviços que criam valor para os consumidores. A competência, por seu lado, é a capacidade de traduzir ideias inovadoras em aplicações para o mercado, produzindo-as de acordo com os melhores standards, com as melhores práticas. Conexões são alianças entre negócios, para alavancar competências centrais, criar mais valor acrescentado, ou simplesmente abrir portas para horizontes mais vastos e para aproveitar a oportunidade de globalização das economias.

Como se traduz essa fonte de vantagem ao nível das cidades e das suas regiões?

R.M.K. - Isso pode significar três cenários. As cidades e regiões podem transformar-se em locais excelentes para conceitos, porque os inovadores podem aí florescer, entrar em contacto com novas formas de pensar e encontrar apoio para transformar as suas ideias em novos negócios visíveis. Ou estas podem diferenciar-se por potenciar a sua competência produtiva, mantendo consistentemente altos standards de fabrico e uma mão-de-obra altamente qualificada. Ou, ainda podem ser regiões que se baseiam em criar conexões para as redes globais, em que os negócios podem encontrar recursos e parceiros, que lhe fazem a ponte para outros mercados. São, todas elas, três formas de ligação do local ao global: ou como "pensadores" ("thinkers"), ou como "fazedores" ("makers") ou como intermediários ("traders").

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